Nós mulheres temos uma maneira muito própria de ver a felicidade e encarar o Amor. Desde a adolescência quase todas sonhamos ser princesas, médicas, bailarinas, ou simplesmente no papel de mãe. Penso, que, nunca sonhei ser nada que estivesse fora de alcance, era tímida e vivia numa forma silenciosa, ninguém dava por mim ,no entanto, era extremamente observadora, diria até ,pensadora, adorava imaginar, fazia disso um estilo onde não se enquadrava ninguém que vivia comigo dentro de casa ,fora dela, tinha apenas uma amiga. Lembro-me de passar tempos mortos à janela, cada um ou uma que passasse perto eu inventava uma história, uma profissão, um estatuto completava-lhes a história consoante a imaginação, essa era prodigiosa, ainda hoje, esteja sossegada a olhar para lado nenhum, é apenas uma aparência ilusória porque na verdade estou a construir uma história com algo que me despertou a atenção. A minha cabeça cansa-se de tanto andar às voltas. Cresci, e o destino escolheu por mim aquilo que eu deveria ser ou que melhor combinaria comigo. Nem sempre perfeito ,mas, melhor não poderia ter escolhido. Adoro olhar longe, o meu horizonte é feito de muitos horizontes, essencialmente o meu, que feliz leva-me a outros mundos embora o céu seja o mesmo, as cores e cheiros levo-os no coração, a minha mala de viagem. Quando viajo longe transporto comigo cheiros de, canela, açafrão, caril, jasmim, alecrim, alfazema, sândalo, e as cores do Outono, o que nada condiz com os cheiros. Quando digo que não sonhava nada que não pudesse alcançar, e era realmente assim, eu num dos muitos sonhos, via-me sempre num bosque onde havia uma única casa com janelas abertas, cortinados rústicos esvoaçantes. No quarto, uma cama de madeira tosca quase desengonçada por lhe faltar linhas perfeitas ,a coberta era de tons vermelho escuro com flores rosa e verde, um verde que até hoje não encontrei, o tapete era feito de tiras de pano entrançadas .Aquela casa tinha uma particularidade, a cozinha, havia nela imensos potes coloridos que eu enchia com compotas várias, nunca faltava na mesa bolos de canela, nem chá escolhido consoante o apetecer da hora do dia ,havia mil e um chá à escolha. Fazia questão de passear e apanhar folhas e flores para fazer os chás. Vivia isolada, sem ninguém por perto ,longe de qualquer príncipe encantado que vivesse nalgum castelo se o houvesse por perto.
Um dia ,encontrei um caminho diferente, por todo ele havia migalhas de pão, segui o trilho como se fosse um pássaro ávido de fome. Quando as migalhas desapareceram, vi-me numa cidade grande, assustada tentei recuar para o bosque, atrás de mim havia apenas um amontoado de casas grandes, tão grandes que mais pareciam...nem sabia o quê (...)
Com o passar do tempo vi-me a morar numa dessas casas grandes, tudo passou a ser diferente, até mesmo o cabelo e o rosto haviam-se transformado, na casa grande havia risos, ouvia-se vozes, entre elas havia uma que gostava de ouvir: Mãe!...
O bosque apenas ficara num lugar sagrado da minha memória fotográfica. Assumira-me mulher,
depois Mãe, aprendera a ser mãe, deixara para lá do horizonte os meus cheiros e cores, o meu bosque desaparecera, talvez tudo não tivesse passado uma miragem, uma invenção infantil da minha imaginação.
Agora, sentada num lugar isolado e só, já que a palavra mãe deixara de fazer-se ouvir logo no primeiro acordar; Os pássaros aprenderam a voar rápido. Com um livro a repousar no regaço, dei por mim a querer voltar a aprender a ser só a menina que gostava de sonhar, deixara um rasto, queria voltar ao mundo dos sonhos, voltar a aprender e deixar a imaginação crescer mais que o sonhar.
Célia M Cavaco ,In DESVIOS