
"Gostar de poesia...será que sempre gostei de poesia? Pergunto-me nos dias em que nada me apetece e ando de um lado para outro sem pertencer a lado nenhum,entre o lado norte,e o lado sul da casa, vejo e ouço sons alternados,canto de aves,folhas de árvores que cantam o vento que passa.Observo as janelas de cada casa, roupas de cores diferentes que vestem corpos que desconheço.Flores vivas e alegres enfeitam varandas,outras,secas e descuidadas mostram o abandono a que são devotadas.Um lugar bonito onde há de tudo um pouco,lugar onde todos me conhecem mais do que eu as conheço a elas,não por descaso,apenas uma solitária maneira de ser. O sol que entra e me aquece neste dia frio, tem diferentes temperaturas,um frio que me arrepia sempre que espreito o lado norte da casa chega-me em forma de brisa da serra de Sintra. Na janela que dá para o que ainda posso ver do Tejo, o frio é amenizado pelo sol.Desta janela vejo a dona Laura que acena com alegria para que eu possa olhar e retribuir em língua gestual um pouco de convívio de que tanto precisa uma vez que mora com uma avançada solidão.A dona Laura abraça-se informando-me que sente frio,eu num gesto de abrir e fechar os vidros, dou a entender que o melhor é resguardar-se dentro de casa.Volto para dentro do meu aconchego,um lugar muito especial,só meu.Acho que posso contar pelos dedos quem teve o privilégio de entrar um pouco neste meu santuário.Um lugar de muitos livros,muitas folhas escritas,outras desenhadas a traços de carvão rostos que invento.É o meu refugio,lugar onde procuro sonhos sempre que fecho os olhos para viajar pelo mundo da música.Quase sempre é Casta Diva na voz da Cecília Bartoli a embalar-me no deixar-me ir por aí.Nem sempre me entendo,reconheço que gero interiormente pequenos conflitos de pura insegurança, o que me leva a procurar silêncios para apaziguar a minha quiça paz interior.Estou rodeada por centenas de folhas brancas,todas elas vestidas de inúmeros rascunhos que deixo ao acaso numa confusão arrumada.Penso muitas vezes em ti,um abstracto rosto que desenho e pinto em inúmeras palavras que leio em voz alta para me ouvir.Há muitas luas que o universo me deixa voar ao encontro de palavras que dançam provocantes indo eu ao encontro do verso que não é poema,antes prosa, onde reinvento uma outra forma de fazer chegar uma história que sem saberes fazes despertar o tal amor pelas palavras inventadas que procuro nesse labirinto onde a poesia se faz humildade e sem pretensão de ser maior do que um jogo de divagações onde as palavras se escrevem entre o que sinto e o que nesse meu caminhar sem ponto de encontro ouso chegar até ti porto de abrigo, deixando um pouco de mim nos teus braços, digo-te vezes sem conta cada vez que me prendes num desses livros que abraço por tempos infinitos de muitas leituras.Se te disser que te amo há muito,dir-me -ás que o sabias desde que abracei o primeiro de muitos poemas... que não sei escrever.
Amo-te,amo-te todas as vezes
que me abraças,amo-te neste
amor de nós sem outro sol
que não o da lua por amante
Amo-te nesta distância que
te abraço todos os dias num
abraçar eterno preso no olhar
dos teus olhos que me vestem
em reflexos dourados de um beijo
que são muitos sempre que te
digo,Amo-te, todos os dias que
acordo a pensar em escrever-te
por mais um dia de toda a minha
vida que sem o saberes repito sem
que possas ouvir...Amo-te!...
Célia M Cavaco,In Desvios
Photo:Maria Clarinda Galante