quarta-feira, 21 de setembro de 2016








Aquela carta que se guarda como sendo a primeira e a ultima que alguém enviou sem remetente,mas que sabemos com a maior das ternuras quem a enviou. Um amor maior, sem coragem de enfrentar olhos nos olhos,atreveu-se à intimidade das palavras como se de repente a coragem estivesse dentro de um papel de linhas, separado pela margem ousada das mãos que navegaram entre a extensão do papel e a turbulência azul da caneta como uma tempestade que ultrapassou fronteiras. A carta dentro de um livro sem capa,sem titulo,sem autor,somente um envelope branco com o mágico para ti.No interior, o papel escrito com amor fazia tremer as mãos, um segredo quase infantil de não revelar a travessura do beijo roubado, a ternura do gosto de ti porque sim.
Um amor sem tempo, frase feita, comum a todos os que segredam as palavras escritas. Amanhã estou no lugar sagrado,podes vir ter comigo? O primeiro de muitos encontros, sem revelarem qual a página que ambos estavam a ler. Um livro a duas mãos,um amor que unia o vocabulário atrevido e erótico,apenas a troca de bilhetes no mesmo livro,na mesma estante, a senha de reserva pertencendo à biblioteca que ambos frequentavam. A folha mantinha o perfume óasis, o cheiro a tabaco, e, o amarrotado da noite em que foi escrita,lembrava a pessoa que entrara sem pedir permissão para ficar. Não era assim com todos os amores inesperados? Acreditava que sim,por isso aquela carta em forma de bilhete era como uma janela aberta para reavivar a memória nostálgica de um tempo que foi de muitas leituras,de muitas partilhas em forma de amor platónico. Na ultima vez,uma pequena notificação a lápis.Gosto de ti assim e depois?...












Célia M Cavaco / Desvios