quinta-feira, 24 de outubro de 2019



Poderá ser amante,conselheira,confusa,a noite,trará com ela a sombra,sombras difusas,desassossego,tudo na noite que se quer escura,com estrelas,lua de prata,cheia,nova,como só a noite é num quarto de paredes brancas com janela virada para o sol nascente. No fundo do quarto apenas uma cama,perto dela,junto da sombra que é ele mesmo o corpo debruçado sobre si com receio das marionetas que se espelham nas paredes brancas e nuas.
Nada mais que o corpo,o lençol amarrotado,o rosto ao contrario do corpo,como se vivesse de costas para a porta,no lado de lá um riso e um segredo.No chão,a única luz que passa é que está no corredor que separa o quarto da vida do lado de fora.
Como se fosse noite de nevoeiro,os barcos longe,nas águas do rio dão aviso como pré anuncio de tempestade,talvez chova,pensou de si para si,nem pensar alto se atreve,a noite pode fazer-se ouvir,as palavras podem escrever-se junto com as sombras..A noite torna-se longa,o corpo descai sobre si,o lençol atreve-se a cobrir-lhe o frio.As horas cantam no relógio que faz tic--tac com cadência até o acordar da madrugada que se avizinha.A primeira claridade ainda escura traz o barulho matutino,alguns cantos de pássaros passam a bater as asas como que a convidar a acordar.A noite a despedir-se das sombras,o corpo na tentativa de erguer-se,cai sobre si como uma cortina numa peça de teatro.A noite sabe de si e do corpo que se entrega como se tivesse travado uma batalha, o que resta da noite é o lençol que ao primeiro raio de sol envergonhado começa a mostrar nudez que a noite escondeu...



Célia M Cavaco,In MOMENTOS



Foto:Pixabay