Abrir um blog de poesia, nada de especial. Mas um blog onde se pode escrever palavras, momentos a partilhar, é um atrevimento, que poderá ser uma ousadia. A minha, onde por instantes viro uma suposta página do meu livro.
quarta-feira, 12 de outubro de 2016
Nas ruas de Lisboa reconhecendo lugares e cheiros. A primeira vez que visitou Lisboa foi numa manhã fria e de intenso nevoeiro rodeada de todos os que chegavam de barco vindos da outra margem.Transportavam sonhos e a azáfama para chegarem a horas ao trabalho para ganhar os parcos escudos para o sustento de suas famílias. O primeiro impacto foi o espaço onde todos se cruzavam sem se olharem nos olhos,depois foi o cheiro a pão quente e café nas ruas paralelas da grande cidade. Adolescente com uma mala para partir.Encontrou-o sentado numa dessas ruas a tocar viola. Timidamente aproximou-se até quase poder-lhe tocar.Parou para o ouvir, tocava divinamente,recebia moedas de quase todos os que não paravam para olhar muito menos sentir a música.No final de uns acordes sem a olhar directamente ele perguntou-lhe: que perfume usas?
Fugiu assustada com a mala de cartão maior que a idade que carregava no corpo franzino. Hoje voltou às ruas de Lisboa os mesmos lugares centenários mas remodelados, a manhã nublada como a primeira vez que pisou a calçada desenhada nas ruas da capital.Reencontrou os mesmos cheiros,o mesmo vaivém de todas as pessoas que apressadamente se deslocam desencontradas umas das outras. Sentado num banco estava ele a tocar viola,o cabelo branco desalinhado,uns óculos a esconder-lhe o olhar para quem depositava moedas na caixa de cartão. Encostou-se à parede suja de publicidade.Reviveu aquele dia em que pela manhã ainda madrugada chegou à sua Lisboa. Depositou uma moeda,ao virar as costas ele disse-lhe: Nunca me disseste o nome do teu perfume.Sorriu com auto confiança respondeu-lhe com largo sorriso.
- Nenhum,apenas água das rosas...
Célia M Cavaco / Desvios
Photo:Edward Ed Gorbaeev
