Abrir um blog de poesia, nada de especial. Mas um blog onde se pode escrever palavras, momentos a partilhar, é um atrevimento, que poderá ser uma ousadia. A minha, onde por instantes viro uma suposta página do meu livro.
segunda-feira, 30 de novembro de 2015
Os meus caminhos quase sempre foram paralelos às estradas onde a velocidade dos carros me empurrava para a sonolência da paisagem,que mudava consoante o verde das árvores,ou das planícies, onde à chegada a água do poço refrescava a sede.Sempre preferi percorrer caminhos,mesmo aqueles em que não havia sequer uma rosa à beira da estrada,nem sequer o cheiro que trouxesse à lembrança outros cheiros que nunca existiram por ali.... Pelos meus caminhos, quase sempre as giestas ou medronheiros me inebriavam os sentidos.Algo despertava em mim,era como se chegasse à casa onde o cordão umbilical tivesse sido enterrado na eira,ao lado da casa térrea de uma só janela e de uma porta com postigo. Ao lado, o balde da cal branca, que imaculadamente pintava as paredes com um pincel tosco.Era a minha casa,a casa que ficava a meio de um caminho solitário. Não havia gente por perto,os únicos ruídos era o silêncio do sol a pique no início da tarde. No final da tarde,na linha do horizonte, o chilrear dos pássaros anunciavam as badaladas do sino da igreja que sabia distante.Tudo ali era longe,os caminhos faziam-se pelas manhãs da lua ainda madrugada...Pelo caminho encontravam-se outros caminhos solitários com pessoas solitárias no percurso longo da vida. Não conheciam as estradas que outrora foram caminhos. Sabiam pouco do outro lado do mundo,ali, a vida era calma sem pressas nem relógios. O único relógio era o galo despertador e o sol que anunciava o ocaso. O horizonte era desconhecido,eram outros caminhos anunciados,até mar havia...comentavam em surdina com medo do apito do comboio que nunca viram,nem o peixe do mar que comiam salgado.O tempo é saudade de uma existência passada,todos os ausentes são presença nas conversas de lareira no inverno das compotas e dos figos secos com a amêndoa...Breve,porque o tempo tem pressa,os caminhos tornar-se-ão sepultura das histórias por contar. Pelos meus caminhos,fiz-me à estrada da vida. Sou uma contadora de estórias com histórias para contar a outros.
Célia M Cavaco / Desvios
Pintura de Carlos Almeida