quinta-feira, 21 de outubro de 2021


 




É no medo que habitamos e confrontamos abismos.
O medo pode levar-nos à coragem ou ao desespero, dependendo
quanto do medo permanecer em nós como uma existência silenciosa ; intrometendo-se, a loucura tem como princípio o fim do medo camuflando essa bipolaridade de sentir alegria e medos alternados, faz parte da construção e defesa que ambicionamos alcançar.
As noites têm nas árvores todas as sombras dançantes, o vento junta-se à dança contemporânea como silhuetas de
papel. A lua esconde-se, as estrelas intimidam-se, o céu escurece. Com papel e lápis desenha -se uma casa de ninguém, apenas uma cor para dar luz e ver-se por uma janela entreaberta a porta com uma tranca de madeira para não entrar visitas inesperadas. Uma casa grande, enorme, com muitas janelas, tantas, que não cabem na folha de papel branco onde o desenho ganha a forma de uma casa grande e de quartos e corredores ainda maiores.
Uma sala, colocar uma mesa de jantar, cadeiras, e num dos cantos da sala uma estante com fotografias de todos que já foram muitos. Na parede um único quadro grande, duas estações, outono e primavera a lembrar a aliança entrelaçada por duas mãos dadas que deixaram marca em ambas as mãos onde os dedos ainda cruzam o dourado abençoado.
Os que foram, os que ficam, tudo num papel branco desenhado com cores escolhidas ao acaso, todas diferentes, como é estranho as coisas que foram simples. Num papel branco o desenho de tudo e muito do que partiu ganha forma abstracta.
Na mão, o lápis , desenha-se o Amor naquele estranho desenho que parecia ser simples.... Como se pode desenhar uma história que não tem memória? Sentimo-nos fortes e sem medos quando guardamos a chave que fecha definitivamente obstáculos, tornamo-nos fortaleza quando as pedras encaixam as razões dum qualquer medo ainda que abstrato.





Celia M Cavaco,In DESVIOS






Foto: Aleah Michele